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Read Ebook: Raios de extincta luz poesias ineditas (1859-1863) by Quental Antero De Braga Te Filo Contributor
Font size: Background color: Text color: Add to tbrJar First Page Next PageEbook has 580 lines and 27077 words, and 12 pagesContributor: Te?filo Braga RAIOS DE EXTINCTA LUZ POESIAS INEDITAS COM OUTRAS PELA PRIMEIRA VEZ COLLIGIDAS PUBLICADAS E PRECEDIDAS DE UM ESCORSO BIOGRAPHICO POR THEOPHILO BRAGA RAIOS DE EXTINCTA LUZ ANTHERO DE QUENTAL RAIOS DE EXTINCTA LUZ POESIAS INEDITAS com outras pela primeira vez colligidas PUBLICADAS E PRECEDIDAS DE UM ESCORSO BIOGRAPHICO POR THEOPHILO BRAGA Wilhelm Storck, Oliveira Martins E?a de Queiroz, Alberto Sampaio, Jayme Batalha Reis Luiz de Magalh?es, Joaquim de Araujo Jo?o de Deus D. Carolina Michaelis de Vasconcellos Santos Valente, Alberto Telles Antonio de Azevedo Castello Branco, Jos? Ben Saude F. Machado de Faria e Maia Jos? Falc?o, Manuel de Arriaga Anselmo de Andrade, Manuel Duarte de Almeida etc., etc. EXPLICA??O PR?VIA Por uma casualidade feliz um companheiro de Anthero de Quental, que por esse tempo frequentava a faculdade de medicina, copi?ra todas as poesias romanticas: chamava-se Eduardo Xavier de Oliveira Barros Leite, fallecido prematuramente em 1872. Por um enlace de familia, obtive por occasi?o da sua morte o caderno das poesias que copi?ra, e que o proprio auctor, que lhe sobreviveu vinte annos, mal suspeitava terem sido conservadas. Guardei-as pois, como um valioso documento, onde estavam os primeiros germens do talento poetico de Anthero de Quental; publicando-as depois da sua morte desgra?ada, restituimos-lhe ? vida subjectiva uma pagina luminosa e sympathica que faltava ? sua obra e ? litteratura portugueza. ANTHERO DE QUENTAL ESCORSO BIOGRAPHICO Bem conhecida ? esta alta individualidade, que se manifestou entre a moderna gera??o com um extraordinario temperamento de luctador, e que de repente ca?u em uma apathia invencivel, em um desalento moral progressivo, em uma decadencia physica precoce, e por ultimo no desespero, que em 11 de setembro de 1891 determinou o suicidio. Quando em t?o breve espa?o vemos essas bellas organisa??es litterarias, como Camillo Castello Branco, Julio Cesar Machado e Anthero de Quental truncarem a sua carreira pelo suicidio, n?o pode deixar de explicar-se essa fatalidade pela nevrose que n'elles era o estimulo do seu talento e o motor das suas desgra?as. E essa mesma nevrose, que se manifestava brilhantemente pela inven??o imaginosa, pela gra?a delicada ou pela inspira??o poetica, nunca lhes deix?ra adquirir uma disciplina mental que os levasse ? analyse de si mesmos, nem uma subordina??o moral que os fortificasse contra o seu espontaneo pessimismo. A critica da ac??o litteraria de Anthero de Quental est? implicita n'esta caracteristica do seu organismo. CARTA AUTOBIOGRAPHICA Ponta Delgada , 14 de maio de 1887. Ex.^ Snr. S? agora me chegou ?s m?os a sua estimada carta de 23 de abril ultimo, pelo facto de me encontrar, ha dois mezes, n'esta ilha trazido aqui por urgentes negocios de familia. A demora das communica??es com o continente explica este atrazo. Agrade?o a v. ex.^a as amaveis e para mim t?o honrosas express?es de sua carta, e nada me p?de ser, como poeta e como homem, mais grato do que o apre?o que um tal mestre e critico manifesta pelas minhas composi??es, ao ponto de querer ser meu interprete e introductor junto do publico o mais culto do mundo e que mais direito tem a ser exigente. Discipulo da Allemanha philosophica e poetica, oxal? que ella receba com benignidade essas pobres fl?res, que uma semente sua, trazida pelo vento do seculo, faz desabrochar n'este solo pouco preparado. Qualquer que seja a sua fortuna, toda a minha gratid?o ? devida ao bom e gentil espirito, que generosamente me toma pela m?o, para me apresentar. As informa??es biographicas e bibliographicas que v. ex.^a me pede, podem reduzir-se ao seguinte: nasci n'esta ilha de S. Miguel, descendente de uma das mais antigas familias dos seus colonisadores, em abril de 1842, tendo por conseguinte perfeito 45 annos. Cursei, entre 1856 e 1864, a Universidade de Coimbra, sendo por ella bacharel formado em Direito. Confesso, por?m, que n?o foi o estudo do Direito que me interessou e absorveu durante aquelles annos, tendo sido e ficando um insignificante legista. O facto importante da minha vida, durante aquelles annos, e provavelmente o mais decisivo d'ella, foi a especie de revolu??o intellectual e moral que em mim se deu, ao sahir, pobre crean?a arrancada do viver quasi patriarchal de uma provincia remota e immersa no seu placido somno historico, para o meio da irrespeitosa agita??o intellectual de um centro, onde mais ou menos vinham repercutir-se as encontradas correntes do espirito moderno. Varrida n'um instante toda a minha educa??o catholica e tradicional, cahi n'um estado de duvida e incerteza, tanto mais pungentes quanto, espirito naturalmente religioso, tinha nascido para cr?r placidamente e obedecer sem esfor?o a uma regra reconhecida. Achei-me sem direc??o, estado terrivel de espirito, partilhado mais ou menos por quasi todos os da minha gera??o, a primeira em Portugal que sahiu decididamente e conscientemente da velha estrada da tradi??o. Se a isto se juntar a imagina??o ardente, com que em excesso me dotara a natureza, o acordar das paix?es amorosas proprias da primeira mocidade, a turbulencia e a petulancia, os fogachos e os abatimentos de um temperamento meridional, muito boa f? e boa vontade, mas muita falta de paciencia e methodo, ficar? feito o quadro das qualidades e defeitos com que, aos 18 annos, penetrei no grande mundo do pensamento e da poesia. Como accommodava eu este culto pelas doutrinas do apologista do Estado prussiano, com o radicalismo e o socialismo de Michelet, Quinet e Proudhon? Mysterios da incoherencia da mocidade! O que ? certo ? que, revestido com esta armadura mais brilhante do que solida, desci confiado para a ar?na: queria reformar tudo, eu que nem sequer estava ainda a meio caminho da forma??o de mim mesmo! Consummi muita actividade e algum talento, merecedor de melhor emprego, em artigos de jornaes, em folhetos, em proclama??es, em conferencias revolucionarias: ao mesmo tempo que conspirava a favor da Uni?o Iberica, fundava com a outra m?o sociedades operarias e introduzia, adepto de Marx e Engels, em Portugal a Associa??o Internacional dos Trabalhadores. Fui durante uns 7 ou 8 annos uma especie de pequeno Lassalle, e tive a minha hora de v? popularidade. Estes pensamentos e muitos outros, mas concatenados systematicamente, formam o que eu chamarei, embora ambiciosamente, a minha philosophia. O meu amigo Oliveira Martins apresentou-me como um buddhista. Ha, com effeito, muita coisa commum entre as minhas doutrinas e o Buddhismo, mas creio que ha n'ellas mais alguma coisa do que isso. Parece-me que ? esta a tendencia do espirito moderno que, dada a sua direc??o e os seus pontos de partida, n?o pode sair do naturalismo, cada vez em maior estado de banca rota, sen?o por esta porta do psychodynamismo ou panpsychismo. Creio que ? este o ponto nodal e o centro de attrac??o da grande nebulose do pensamento moderno, em via de condensa??o. Por toda a parte, mas sobretudo na Allemanha, encontram-se claros symptomas d'esta tendencia. O occidente produzir? pois, por seu turno, o seu Buddhismo, a sua doutrina mystica definitiva, mas com mais solidos alicerces e, por todos os lados, em melhores condi??es do que o Oriente. N?o sei se poderei realizar, como tenho desejo, a exposi??o dogmatica das minhas id?as philosophicas. Quizera concentrar n'essa obra suprema toda a actividade dos annos que me restam a viver. Desconfio, por?m, que n?o o conseguirei; a doen?a que me ataca os centros nervosos, n?o me permitte esfor?o t?o grande e t?o aturado como f?ra indispensavel para levar a cabo t?o grande empreza. Morrerei, por?m, com a satisfa??o de ter entrevisto a direc??o definitiva do pensamento europeu, o Norte para onde se inclina a divina bussola do espirito humano. Morrerei tambem, depois de uma vida moralmente t?o agitada e dolorosa, na placidez de pensamentos t?o irm?os das mais intimas aspira??es da alma humana e, como diziam os antigos, na paz do Senhor!--Assim o espero. Ao bom e amavel espirito que me introduz, a mim neophyto, n'esses grandes circulos do pensamento e do saber, tributo, al?m de muita sympathia, indelevel gratid?o. E sou de v. ex.^a com a maxima considera??o criado m.^o obrg.^o A OBRA POETICA DE ANTHERO DE QUENTAL ORDEM PARA UMA EDI??O DEFINITIVA DAS OBRAS POETICAS COMPLETAS DE ANTHERO PALAVRAS ALADAS PALAVRAS ALADAS Raios de extincta luz, eccos perdidos De voz que se sumiu no espa?o absorta-- Meus cantos voar?o de edade em edade, Como folhas que ao longe o vento espalha. N?o sabe a folha j? mirrada e secca, Que um s?pro do tuf?o levou revolta, Que outro sopro talvez desfa?a em breve-- N?o sabe a triste o ramo onde nascera, A seiva que a nutriu, quando inda bella, O tronco que adornou com verde galla, E onde entre irm?s folgou por tarde amena? Soltos do tronco, sem calor, sem vida, Filhos orph?os que um seio n?o aquece, Um seio maternal ebrio de affectos, Meus cantos voar?o de edade em edade, Como folhas que ao longe o vento espalha. Mas se alguem, vendo a folha abandonada, Lembrar e vir na mente o tempo antigo Em que bella, vestindo pompa e gallas, Brilhou rica de seiva e luz e vida; Se na mente sonhar a pura essencia Que animara esse p? ahi revolto; Se corpo der ? sombra fugitiva, E a voz unir ao ecco, e o foco ao raio; Se alguem souber do canto o sentir intimo, Oh, esse ha de entender a vida, a cren?a D'essa alma que animara outr'ora o canto. Aos mais ser? mysterio o canto e a lyra, ? Liberdade, a Amor e a Deus votada: E j?, soltos do tronco onde medraram, Meus cantos voar?o de edade em edade, Como folhas que ao longe o vento espalha. Coimbra, Novembro, 1860. LA?O D'AMOR LA?O D'AMOR Que heide dar de melhor? Ai, n'estes tempos De pobres affei??es, de tibias cren?as, --Fonte que os s?es do estio tem seccado-- Aonde ha f? tam viva, que trasborde, Enchendo um peito n'outro peito amigo? Que esperan?as c? da terra ha hi tam firmes, Tam ricas de futuro, que dois s?res Possam firmar-se n'ellas sem receio E abandonar-se todo ao seu arrimo, Qual bra?o de mulher em bra?o de homem? E quem pode encontrar-se em egual via, E ir, com norte egual, seguir seu rumo Quando tantos caminhos v?o cruzando N'estes tempos o mundo do espirito? Ah, n'este sec'lo, amigo, solitario Cada qual segue triste a sua estrada, Caminheiro de um dia, e silencioso, Contando, como o avaro, os tristes restos Das suas illus?es, das suas cren?as, A si pergunta o que ficou de tudo; Olha as bandas longiquas do horizonte E de novo interroga, em desalento, Se o futuro lhe guarda alguma esp'ran?a, Se o abysmo ? o termo da jornada?! Se l? de longe em longe alguma tenda, Se uma fonte que ensombra alta palmeira. Lhe alveja no deserto; se inda um pouco Lhe repousa a cabe?a afadigada, N?o faz, crente no Deus que o tem guiado, A ora??o da noite, a ac??o de gra?as E, antes que cerre as palpebras, medita... No repouso s? busca o esquecimento: Dorme o somno agitado de uma noite Sob a tenda que o acaso lhe depara; De manh?, sem levar uma saudade, Sem as deixar tambem, eil-o seguindo Do fatal peregrinar a longa via. Que lhe importa o passado ou o futuro? P'ra d?r que soffre em si tudo ? presente, Aqui, ali, em toda a parte o punge... Quem lhe dera esquecer, n?o recordar-se... Add to tbrJar First Page Next Page |
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