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Munafa ebook

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Read Ebook: Infanta: tragédia by Figueiredo Manuel De

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Ebook has 403 lines and 11073 words, and 9 pages

Porque rezais? ? tudo oiro... ? tudo oiro... Toca a cantar... Ide bailar... Toca a cantar que ainda ? folia!...

Quando eu, crian?a ainda, ia com El-Rei meu Pae ver chegar as naus, o povo n?o rezava, n?o chorava... Cantava e ria o povo; e era ainda cantando que resava! Agora chora!... Porque estranha loucura chora o povo agora?! Que v?, que sente, elle?!

A terra tem o mesmo encanto e a mesma alegria o c?u! ? o mesmo scenario de magia. E o povo chora... e o povo reza...

Parece n?o v?r o que o cerca; fica como cego a ouvir o agoureiro. Chamam-lhe a Ave-agoirenta; receiam-no, temem-no, acreditam n'elle!

Mas que verdade, teem, acaso, as suas fallas?! A sua voz, fria e distante, lembra morte, ? certo. ? uma voz d'alem tumulo, d'alem vida--prophetica! Ainda a julgo estar ouvindo!...

UMA AIA

Desviai de v?s, Senhora, t?o negro imaginar. Para que recordar palavras doidas? Para que estar, Senhora, a dar-lhe ouvidos?!

Palavras doidas sim, palavras doidas!... Se n?o f?ra o tom da sua voz! Como ella ? fria, fria, e lembra a Morte!

A Morte n?o v?, n?o falla, n?o ouve. ? cega, ? surda, ? muda a Morte! Para que estar, Senhora, imaginando que ella pode fallar na voz de um doido?

Eu, que sou physico d'El-Rei, e j? um velho, a quem a morte de manso vem tomando, por vezes, estudando as caveiras interrogo-me!

Olho-as bem... Vejo n'ellas o meu dia de amanh?, e n?o as olho com horror; pelo contrario, vejo-as com amor, com simpathia... e at?, recordando as minhas d?res, acaricio-as!

As orbitas n?o teem olhos; as boccas n?o teem lingua; os ouvidos s?o buracos apenas. N?o podem ouvir, nem ver, nem fallar!

Porque, Senhora!? Porque a Morte ? paz, socego, anulamento; ? nada... Os mortos dormem e n?o querem que os acordem. Que se importam elles dos vivos, se repousam!?... Deixai a voz do doido...

Porque s? olhaes e interrogaes caveiras n?o podeis comprehender os mysterios que nos cercam. S? mestre Lopo, que l? nos astros, poder? dizer toda a verdade.

Ave-Marias! Rezemos...

E um anjo do Senhor, cheio de luz, desceu dos C?us ? Terra e disse: <>

Como ? grande a calma religiosa d'esta hora!

Como anoiteceu depressa! A terra dorme j? em sombra e bruma. S? o rio e o c?u teem ainda luz!

PINTOR

Tudo adormece em silencio, tudo dorme...

S? eu fico ancioso esperando a madrugada! Tenho ancia de luz como as flores e as aves! As sombras s?o negras, entristecem-me; fico como cego. S? no sol, s? nas c?res, sinto a vida e tenho alegria e ancia de viver.

POETA

A luz s? a adoro, s? a sinto, no adormecer suave d'esta hora, em que a natureza inteira est? tambem de m?os postas a rezar!

Luz que queima, que enlouquece, e tudo revela, tudo acorda, eu a maldigo!

Luz que ? fogo em minha alma, e maravilha em meus olhos, eu a odeio.

Mas esta, em que a saudade se deixou cruxificar, e tem m?os de mysterio e acaricia, e vem de manso afagar meus olhos, embalando meu sonho pela noite fora, e em negrumes abafa minha d?r, dando-me paz, serenidade, calma, esta, Senhora minha, eu a adoro, eu a bendigo.

INFANTA

Mas porque odiar assim a luz, assim a vida?

Porque acorda... Porque tece feiti?os de loucura... Porque illumina, revela, transfigura. Porque cria sonhos. Imagens que s?o reaes e que se afastam, que vemos e n?o podemos alcan?ar...

Odeio a luz, Senhora, porque ella illumina o meu soffrer, e entra em meu cora??o e abre-o de par em par ao soffrimento!

Porque estendo os bra?os, anciosos, loucos, e meus bra?os se perdem no ar!...

Vejo o meu sonho e n?o o alcan?o... Tenho-o junto a mim e est? distante... E soffro mais ainda!

Antes a noite! Vejo-o, sinto-o, palpita e vive em mim, como se meu cora??o ganhasse azas e em meu peito ficassem a bater, como a quererem livrarem-no da Morte, antes da Morte vir e lhe tocar!

INFANTA

Mas se sonhais... O sonho ? pensamento, n?o se v?, nem se alcan?a, s? pode ser imaginar...

Senhora, perdoai... Tendes raz?o, por certo. Mas foram meus olhos, de encantados, que peccaram, foram meus olhos que sonharam primeiro.

Elles viram, sentiram, deslumbraram-se. Que culpa teem elles?! Depois... minha alma enlouquecida, encheu-se de sombras e de d?r!

E a D?r ? a grande alma do Universo, que entrando em n?s toma-nos todo, torna-nos meninos em seus bra?os, e fica a embalar-nos para a Morte, a cantar e a chorar!...

Senhora, por muito alto que estais, perdoae ter-vos fallado de mim...

Pela Virgem M?e...--Por Santhiago...--Miserere nobis...--Misericordia!...

E sempre o povo!... Escutai... ainda se ouve... S? o sinto rezar, s? o ou?o chorar!... Assim s? se reza pelos mortos...

Mestre Lopo entende o povo?!

POETA

Mestre Lopo nunca v? o povo. Foge da multid?o com horror, quasi com medo.

Sosinho, em silencio, olha as estrellas toda a noite. E levado por ellas, em seus roteiros, ? um caminheiro do c?u, a desvendar segredos de Deus!

INFANTA

Oh! quem me dera ver como elle v?! Desvendar o mysterio... mas eu olho o c?u e nada vejo.

O PHYSICO

Comprehender estrellas, em verdade vos digo, Senhora, que n?o entendo. Parece-me phantasia ou loucura de astrologo.

POETA

Olh?-las e escut?-las!... Quantas vezes meus olhos, pela noite, as teem ouvido...

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