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Munafa ebook

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Read Ebook: O retrato de Venus e estudos de historia litterária by Almeida Garrett Jo O Batista Da Silva Leit O De Almeida Garrett Visconde De

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anudos periodos do conde da Ericeira, regenerado a poesia e restitu?do a lingua.

Outravez ainda o limitado d'este bosquejo me impede de mencionar outros ingenhos que tanto mereceram da patria e da litteratura e remo?aram a perdida lingua de Cam?es. Exige o meu assumpto e o meu espa?o que me estreite no c?rculo poetico.

Ap?s estes vem o virtuoso e honrado Quita, a quem pagou a patria com miseria e fome as immensas riquezas que para a lingua e litteratura de seus versos herdou. Um pobre cabelleireiro, a quem as musas que serviu, os grandes que com ellas honrou nunca tiraram do triste officio, p?de de sua baixa condi??o social alevantar-se do primeiro grau litterario, que acaso lhe disputam ignorantes ou presump?osos, nenhum homem de gosto deixar? de lh'o dar.

Este ? em meu humilde conceito o nosso melhor bucolico: t?mo a liberdade de contrastar a opini?o commum, porque o meu dever de cr?tico me obriga a ennunciar lealmente o meu pensamento. Tenho para mim que a immensa c?pia de composi??es pastoris, as quaes n?o s?o riqueza, mas desperdicio de nossas musas, ou peccam por empoladas, por inverosimeis, por baixas, por demasiado naturaes, por sobejo elevadas. Um meio termo difficilimo de tocar, de n'elle permanecer, um stylo singelo como o campo, mas n?o rustico como as brenhas, s?o dos mais difficeis requisitos que d'um poeta se podem exigir. Se tem ingenho, custa-lhe a moldar-se e a rete-lo que n?o suba mais alto que a difficil medida, e raro deixa de a exceder, de perder-se do bosque e acabar em jardins cidad?os e conversas de damas e cavalheiros o que come??ra no monte ou na varzea entre pastores e serranas.

Nem Virgilio d'ahi escapou, nem Sannazaro, nem Cam?es; Gessner sim, e depois de Gessner, o nosso Quita. N?o digo que n?o tenha defeitos, ainda em seu genero pastoril; mas a boa e honrada cr?tica falla em geral, louva o bom, nota o mau, por?m n?o faz timbre em achar defeitos e erros na menor falta para se regosijar da censura. Grandes homens, grandes erros: a natureza da mediocridade ? cingir-se a tristes preceitos para esconder sua mesquinhez: por?m de taes nunca fallou posteridade. Horacio e Boileau foram atrevidos quando lhes cumpriu, e desprezaram regras e arte quando os chamou a natureza, e lhes mostrou o sublime. Philinto, que os sabia de c?r, tambem se levantou acima das regras, e nunca foi tamanho. E todavia foi elle o maior poeta de seu seculo: mas os grandes ingenhos n?o contraveem a lei, s?o superiores a ella, e s?o elles viva lei.

Mui distincto logar obteve entre os poetas portuguezes d'esta epocha Claudio Manoel da Costa: o Brazil o deve contar seu primeiro poeta, e Portugal entre um dos melhores.

E agora come?a a litteratura portugueza a avultar e enriquecer-se com as produc??es dos ingenhos brazileiros. Certo ? que as magestosas e novas scenas da natureza n'aquella vasta regi?o deviam ter dado a seus poetas mais originalidade, mais differentes imagens, express?es e stylo, do que n'elles apparece: a educa??o europeia apagou-lhes o espirito nacional: parece que receiam de se mostrar americanos; e d'ahi lhes vem uma affecta??o e impropriedade que d? quebra em suas melhores qualidades.

Muito havia que a tuba epica estava entre n?s silenciosa, quando Fr. Jos? Dur?o a embocou para cantar as romanescas aventuras de Caramur?. O assumpto n?o era verdadeiramente heroico, mas abundava em riquissimos e variados quadros, era vastissimo campo s?bre tudo para a poesia descriptiva. O auctor atinou com muitos dos tons que deviam naturalmente combinar-se para formar a harmonia de seu canto; mas de leve o fez: s? se estendeu em os menos poeticos objectos; e d'ahi esfriou muito do grande interesse que a novidade do assumpto e a variedade das scenas promettia. Notarei por exemplo o episodio de Mo?ma, que ? um dos mais gabados, para demonstra??o do que assevero. Que bellissimas cousas da situa??o da amante brazileira, da do heroe, do logar, do tempo n?o pod?ra tirar o auctor, se tam de leve n?o houvera desenhado este, assim como outros paineis?

Depois de Diniz o logar immediato nos anacreonticos pertence a outro Brazileiro.

Gonzaga mais conhecido pelo nome pastoril de Dirceu, e pela sua Marilia, cuja belleza e amores tam c?lebres fez n'aquellas nomeadas lyras. Tenho para mim que ha d'essas lyras algumas de perfeita e incomparavel belleza: em geral a Marilia de Dirceu ? um dos livros a quem o publico fez immediata e boa justi?a. Se houvesse por minha parte de lhe fazer alguma censura, s? me queixaria, n?o do que fez, mas do que deixou de fazer. Explico-me: quizera eu que em vez de nos debuxar no Brazil scenas da arcadia, quadros inteiramente europeus, pintasse os seus paineis com as c?res do paiz onde os situou. Oh! e quanto n?o perdeu a poesia n'esse fatal ?rro! se essa amavel, se essa ingenua Marilia fosse, como a Virg?nia de Saint-Pierre, sentar-se ? sombra das palmeiras, e em quanto lhe revoavam em t?rno o cardeal suberbo com a purpura dos reis, o sabi? terno e melodioso,--que saltasse pelos montes espessos a cotia fugaz como a lebre da Europa, ou grave passeasse pela orla da ribeira o tatu esquamoso,--ella se entretivesse em tecer para o seu amigo e seu cantor uma grinalda n?o de rosas, n?o de jasmins, por?m dos roixos martyrios, das alvas flores dos vermelhos bagos do lustroso cafezeiro; que pintura, se a desenh?ra com sua natural gra?a o ingenuo pincel de Gonzaga!

Justo elogio merece o sensivel cantor da infeliz Lindoya que mais nacional foi que nenhum de seus compatriotas brazileiros. O Uraguay de Jos? Bazilio da Gama ? o moderno poema que mais merito tem na minha opini?o. Scenas naturaes mui bem pintadas, de grande e bella execu??o descriptiva; phrase pura e sem affecta??o, versos naturaes sem ser prosaicos, e quando cumpre sublimes sem ser guindados; n?o s?o qualidades communs. Os Brazileiros principalmente lhe devem a melhor cor?a de sua poesia, que n'elle ? verdadeiramente nacional, e leg?tima americana. M?goa ? que tam distincto poeta n?o limasse mais o seu poema, lhe n?o d?sse mais amplid?o, e quadro t?o magnifico o acanhasse tanto. Se houvera tomado esse trabalho, desappareceriam algumas incorrec??es de stylo, algumas repeti??es, e um certo desalinho geral, que muitas vezes ? belleza, mas continuado e constante em um poema longo, ? defeito.

NOTAS DE RODAP?:

Digo de seu genero, porque o Orlando furioso tambem ? heroicomico, mas d'outro genero.

Em antiguidade.

Epocha, segunda decadencia da lingua e litteratura; gallicismo e traduc??es

? volta este tempo se formou a academia das sciencias de Lisboa pelos generosos esfor?os do duque de Laf?es. Esse corpo scientifico, de quem tanto bem se augurou para a lingua e litteratura nacional, nem fez tudo o que d'elle se esperava, nem uma parte mui pequena do que podia e lhe cumpria fazer: mas nem foi inutil, nem, como alguns teem querido, prejudicial. E todavia sua for?a moral n?o foi bastante para vencer um mal terrivel que j? no tempo de sua crea??o se manifestava, mas que depois, cresceu e avultou a ponto, que veio a tornar-se quasi indestructivel.

Miseria ? que o geral dos portuguezes jurou nas palavras de quatro peralvilhos que essas calumnias apregoavam: passou em julgado que os classicos se n?o podiam ler, e ninguem mais quiz tomar o trabalho nem sequer de examinar se sim ou n?o assim era.

N'este estado de cousas appareceram em Portugal dous homens extraordinarios, ambos dotados pela natureza de prodigioso ingenho poetico, Francisco Manoel e Bocage. Aquelle, filho da eschola de Gar??o e Diniz, cultivou muito tempo as musas classicas, e j? imbuido no gosto da antiguidade, j? imitador e rival de Horacio e Pindaro, come?ou a ser conhecido em idade madura. Este, quasi desd'a infancia poeta, appareceu no mundo em toda a effervescencia dos primeiros annos, ardente cantor das paix?es, enthusiasta, agitado do seu proprio natural violento, rapido, insoffrido, sem cabal instruc??o para poeta, com todo o talento para improvisador.

Por?m nos intervallos lucidos que a Bocage deixava o fatal desejo de brilhar, n'alguns instantes que, despossesso do demonio das hyperboles e antitheses, ficava seu grande ingenho a sos com a natureza e em paz com a verdade, ent?o se via a immensidade d'essa grande alma, a fina tempera d'esse raro ingenho que a aura popular estragou, perdeu o pouco estudo, os costumes desregrados, a miseria, a dependencia, a soltura, a fome. Muitas epistolas, varios idilios maritimos, algumas fabulas, e epigrammas, as cantatas, n?o s?o mediocres titulos de gl?ria. Dos sonetos ha grande c?pia que n?o tem igual nem em portuguez, nem em lingua nenhuma, d'uma for?a, d'uma valentia, d'uma perfei??o admiravel. O resto ? pequeno e pouco. A linguagem ? pobre; ?s vezes facil, mas em geral esca?a. Sab?a pouco a lingua; a for?a do grande instincto lhe arredava os erros; mas as bellezas do idioma, s? as d? e ensina o estudo. As traduc??es de Ovidio, Delille e Castel s?o primorosas.

Mas de traduc??es estamos n?s gafos: e com traduc??es levou o ultimo golpe a litteratura portugueza; foi a estocada de morte que nos jogaram os estrangeiros. Traduzir livros d'artes, de sciencias ? necessario, ? indispensavel; obras de gosto, de ingenho, raras vezes convem; ? quasi impossivel faz?-lo bem, ? m?ngua e n?o riqueza para a litteratura nacional. Essa casta de obras estuda-se, imita-se, n?o se traduz. Quem assim faz accomoda-as ao character nacional, d?-lhes c?r de proprias, e n?o s? veste um corpo estrangeiro de alfaias nacionaes , mas a esse corpo d? fei??es, gestos, modo, e indole nacional: assim fizeram os Latinos, que sempre imitaram os Gregos e nunca os traduziram; assim fizeram os nossos poetas da boa idade. Se Virgilio houvera traduzido a Iliada, Cam?es a Eneada, Tasso os Lusiadas, Milton a Jerusalem, Klopstock o Paraiso perdido; nenhum d'elles fora tamanho poeta, nenhuma d'essas linguas se enriquecera com tam preciosos monumentos: e todavia imitaram uns dos outros, e d'essa imita??o lhes veio grande proveito.

Esta mania de traduzir subiu a ponto em Portugal, e de tal modo estragou o gosto do p?blico, que n?o s? lhe n?o agradavam, mas quasi n?o intendia os bons originaes portuguezes: a poesia, a litteratura nacional reduziu-se a monotonos sonetos, a trovinhas d'amores, a insipidas enfiadas

A sua epistola sobre a arte poetica e lingua portugueza, p?de rivalizar com a de Horacio aos Pis?es: for?a d'argumentos, eloquencia da poesia, nobre patriotismo, finissimo sal da satyra, tudo ahi peleja contra o monstro multiforme.

Entre as epistolas ha muitas admiraveis: dos contos e fabulas, alguns com elegante sal e chiste. As traduc??es do Oberon de Wielland, da Guerra punica de Silio Italico, mas sobre todas, a dos Martyres de Chateaubriand, s?o thesouros de linguagem e de poesia.

Nenhum poeta desde Cam?es havia feito tantos servi?os ? lingua portugueza: so per si Francisco Manuel valeu uma academia, e fez mais que ella; muita gente abriu os olhos, e adquiriu amor a seu tam rico e bello, quanto desprezado idioma: e se ainda hoje em Portugal ha quem estude os classicos, quem se n?o envergonhe de l?r Barros e Lucena, deve-se ao exemplo, aos brados, ?s invectivas do grande propugnador de seus foros e liberdades.

Nos ultimos periodos de sua longa vida afrouxaram as energicas faculdades d'este grande poeta, e excepto a traduc??o dos Martyres quasi tudo o mais que fez ? tibio e morno como de um octogenario se podia esperar. O nimio temor de commeter gallicismos, a que tinha justo e sancto horror, o fez cahir em archaismos e affecta??o demasiada de palavras antiquadas e excessivos hyperbatos. N?o s?o por?m estas faltas, nem tantas nem tamanhas como o pregoou a inveja e a ignorancia.

Muito honrosa men??o deve a historia da lingua e poesia portugueza a Domingos Maximiano Torres, cujas eclogas rivalizam com as de Quita e Gessner, cujas can?onetas s?o, depois das de Claudio Manuel da Costa, as melhores que temos. Foi este muito intimo de Francisco Manuel, mas tenho por mui exagerados os elogios que d'elle recebeu.

Antonio Ribeiro dos Santos, honra da magistratura portugueza, foi imitador e ?mulo de Ferreira: poucos ingenhos, poucos characteres, poucos stylos ha tam parecidos; se n?o que o auctor dos coros da Castro era muito maior poeta, e o cantor do grande D. Henrique muito melhor metrificador. ?sta ode ao infante sabio, algumas outras a varios heroes portuguezes, algumas das epistolas, e especialmente os versos que lhe dictava a amizade para o seu Almeno, s?o d'uma elegancia e pureza de linguagem rarissima em nossos dias.

Duas ou tres odes d'este virtuoso e erudito padre s?o mui bonitas.

De Jos? Anastacio da Cunha, que das mathematicas puras nos deu o melhor curso que ha em toda Europa, d'esse infeliz ingenho a quem n?o impediam as rectas de Euclides, nem as curvas de Archimedes de cultivar tambem as musas; de tam illustre e conhecido nome que direi eu sen?o o muito que me peza da raridade de suas poesias? Todas s?o philosophicas, ternas e repassadas d'uma tam meiga sensibilidade algumas, que deixam n'alma um como echo de harmonia interior que n?o vem do metro de seus versos, mas das ideias, dos pensamentos. Todavia ha mister l?-lo com preven??o, porque a phrase nem sempre ? portugueza de lei.

A cantata de Pygmali?o, a ode O homem selvagem s?o excellentes tambem.

Aqui me cai a penna das m?os: o estadio livre para a critica imparcial acabou. Nem posso continuar a exerc?-la sem temor, nem o faria ainda assim, pois n?o quizera v?r revogadas minhas presumidas senten?as pela severa posteridade, quasi sempre annulladora de juizos contempor?os.

Apezar dos motivos referidos, pedirei uma venia mais para mencionar como um poema que faz summa honra ao nome portuguez, a Medita??o do snr. J. A. de Macedo, que tem sido censurada por quem n?o ? capaz de intend?-la. N?o sei eu se ella tem defeitos; ? obra humana, e de certo lhes n?o escapou; mas sublimidade, c?pia de doctrina, phrase portugueza, e grandes ideias, s? lh'o negar? a cegueira ou a paix?o.

Cita-se com elogio o nome do snr. J. F. de Castilho, joven poeta que se despica da injuria da sorte que o privou da vista, com muita luz de ingenho poetico.

As Georgicas do snr. Mozinho d'Albuquerque fizeram a reputa??o poetica de seu benemerito auctor. Alguns lhe acharam demaziada erudi??o, e queriam mais poesia e menos sciencia. Eu por mim tomarei a confian?a de pedir ao illustre poeta, em nome da litteratura portugueza, que na segunda edi??o de sua tam util obra n?o desdenhe de aproveitar os muitos e riquissimos ornatos que habilmente p?de tirar de nossas festas ruraes, de nossas usan?as , das descrip??es de nosso formoso paiz; com que decerto far? mais nacional e interessante seu estimavel poema. N?o sei tambem se alguma incorrec??o typographica ou de c?pia, seria origem de varias imperfei??es e impurezas de linguagem, que os escrupulosos lhe notam.

Tudo isso esperamos os portuguezes que nos vangloriamos de sua excellente obra, v?-lo melhorado na proxima edi??o que j? reclama o publico impaciente.

A litteratura portugueza n?o mostra presentemente grandes symptomas de vigor: mas ha muita for?a latente sob essa apparencia; o menor s?pro animador que da administra??o lhe venha, atear? muitos luzeiros com que de novo brilhe e se engrande?a.

FIM

NOTAS DE RODAP?:

Assim lhe succedeu, principalmente em muitos dos, por natureza e essencia, hyperbolicos elogios dramaticos; genero de composi??o extravagante e quasi sempre ridiculo.

INDICE

DAS

OBRAS CONTIDAS N'ESTE VOLUME

Retrato de Venus 5

Notas 57

Ensaio sobre a historia da pintura 89

Bosquejo da historia da poesia e lingua portugueza 163

RECTIFICA??O

Nota do transcritor: Isso foi collacada na posi??o certa.

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